13° GIFE,  contradições e um convite em nome da Baixada Fluminense.

Início
Notícias
Postagem

Escrito por Priscila Oliveira e Débora Silva.

Duas semanas após o 13° Congresso GIFE, o primeiro no Nordeste e o primeiro em que ‘Sim Eu Sou do Meio’ participa, conseguimos decupar o que vivemos lá e o que tudo isso significa para a luta coletiva e para nossa organização individualmente

Para quem não conhece, o GIFE é uma associação composta por investidores. Entre suas ações está a realização de um congresso bianual realizado por essa rede de instituições associadas. É voltado à superação dos desafios no campo da filantropia por meio da conexão de diferentes organizações captadoras e organizações doadoras.

Em primeiro lugar fica o agradecimento à rede que nos possibilitou estar presente com Débora Silva, nossa diretora executiva, Clézia, nossa frente em juventude e Priscila nossa frente em projetos.

Fica também o agradecimento a todos que trabalharam para a realização do GIFE. É um espaço muito potente. Da nossa parte aprendemos coisas novas, experienciamos trocas que pareciam ser impossíveis e voltamos para a Baixada Fluminense com ainda mais perspectivas.

Contradições

O tema estava colocado. Desconcentrar poder, riqueza e conhecimento. Entre palestrantes e debatedores teve quem tentasse fugir do seu caráter de urgência concentrando a fala em avanços, boas práticas e até mesmo tentando silenciar críticas.

Teve doadores que assumiram que a desigualdade ainda está fortemente presente nas organizações às quais representa, justificando longamente suas dificuldades no que chamou de choque cultural.

Teve quem defende que produzir conhecimento unilateralmente não resulta em uma contribuição incompleta do ponto de vista científico e insuficiente do ponto de vista da descentralização.

Mas teve também quem escancarou com coragem  a fragilidade desse ambiente em que a mesa está posta para uma conversa que resulte efetivamente em quebrar ciclos de desigualdade.

Débora Silva, Diretora Executiva da ‘Sim! Eu Sou do Meio’, disse:

“O lema deveria ser desconcentrar poder, riqueza e [R]econhecimento. Porque conhecimento nós já temos.”

Luta Coletiva 

O nós a que Débora se referiu são as organizações que executam projetos sociais em seus territórios. Não apenas organizações que representam seus territórios ou causas em ações de advocacy. Essas são muitas vezes oriundas de territórios populares, grandes aliadas de organizações executoras de base comunitária, mas ficam concentradas no papel de articulação de rede e sensibilização de financiadores, enfrentando também desafios à sua própria sustentabilidade institucional.

As OSCs executoras de projetos e ações territoriais geram impacto direto na ponta e estão muitas vezes estranguladas economicamente, fazendo muitíssimo com pouco ou nenhum aporte financeiro oriundo de grandes corporações.

Giovanni Harvey, presidente do Fundo Baobá, denunciou que “o que se pratica no Brasil é uma filantropia recreativa, onde os interesses contemplados são os dos patrocinadores e não os da sociedade”

Ele tem razão. Nem mesmo o domínio da linguagem e dos códigos exigidos por entidades doadoras são suficientes para inserir a maioria das organizações executoras de base territorial no grupo de financiadas. Isso enquanto as grandes organizações de sempre recebem aportes enormes de recurso para executar projetos com impactos superficiais exatamente por estarem desconectados da realidade do território.

Bianca Santana, jornalista, escritora e palestrante, ao ser questionada sobre como a Filantropia pode de fato desconcentrar poder, conhecimento e riqueza, respondeu objetivamente:

“Mas vocês vão ouvir dessa vez? Porque estamos dando essa resposta há muito tempo.”

De fato, não é de hoje que movimentos sociais defendem que as decisões no campo da filantropia precisam ser tomadas com as organizações executoras e que os financiamentos institucionais precisam ser feitos por um longo prazo.

O conhecimento empírico, as tecnologias sociais, os dados qualitativos, elucidativos dos dados quantitativos que grandes institutos de pesquisa coletam, tudo isso que é produzido por organizações executoras de base territorial é sistematicamente ignorado.

A luta é também individual

A ‘Sim! Eu Sou do Meio’ é uma organização que nasce afirmando seu território — a rua do meio, cidade de Belford Roxo, na Baixada Fluminense do RJ.

Uma OSC que atua a partir das demandas locais, para o fortalecimento do seu território e das pessoas que vivem nele.

Em sua região fortalece também outras organizações de base comunitária.  É uma organização premiada por diversos instituições públicas e privadas e que realiza um número expressivo de atendimentos diários, com um impacto local profundo, alcançado por meio de ações multisetoriais.

No entanto, ainda assim, enfrenta dificuldades para acessar recursos. O fato de estar na Baixada Fluminense do RJ e não na capital se sobrepõem ao fato de estar localizada no segundo estado que mais recebe aporte financeiro no país.

Embora existam organizações de incidência atuando em rede e fazendo ecoar as demandas de OSCs. Embora exista o campo da filantropia e que seja extremamente positivo que se promova espaços para que ele seja discutido. Mesmo assim, organizações executoras estão subvalorizadas.

Essas organizações não são invisíveis, muitas vezes até possuem ótimas estratégias de comunicação. Porém, são ignoradas pela filantropia que prefere destinar recursos para grandes organizações.

Sabemos que a Filantropia não é essa entidade amorfa, etérea e inalcançável.

Trata-se de instituições e pessoas.  Diante desse fato cabe deixar ao conjunto de financiadores do GIFE um questionamento: qual a estratégia que será colocada em prática por sua instituição para desconcentrar poder e riqueza reconhecendo os saberes e o valor de organizações executoras de base territorial?

Você, profissional que compõem a cadeia de fomento, quando receber o chamado de organizações executoras de base territorial vai ignorar ou vai se desafiar a abrir novas frentes de conexão?

Assim como a luta é coletiva e individual, as soluções também são e passam muitas vezes pelo desconforto de se lançar em novos espaços como fez o SESM ao participar do GIFE, contribuindo com o debate e buscando conexões.

Agora, pensando na sustentabilidade institucional de organizações da Baixada Fluminense, como a nossa própria, e na simultânea concentração de recursos, poder e reconhecimento, somos nós que fazemos o convite aos financiadores para que desçam para a Baixada, dessa vez a do Rio, para ver e apoiar o que somos capazes se fazer.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *